Naufrágio: Barco foi ao fundo mas os nove pescadores salvaram-se
Foi
num ambiente de muita emoção e alívio que os nove pescadores foram
recebidos ontem ao final da tarde pelos familiares, em Caxinas, Vila do
Conde, depois de terem sido resgatados pela Força Aérea a 300
quilómetros ao largo da Figueira da Foz, local onde o barco em que
seguiam – o ‘Luís Fortunato’ – se afundou após ser levantado no ar por
uma onda de seis metros.
'Meu filho, não
voltes para o mar', disse, banhada em lágrimas, a mãe de um dos
tripulantes da 'motora' que se partiu e foi ao fundo pouco depois das
23h00 de ontem, ao cair 'em falso' de uma onda com mais de seis metros.
A
chegada às Caxinas do autocarro da Câmara do Montijo, em que os
pescadores viajaram desde a base da Força Aérea, foi saudada por cerca
de três dezenas de familiares que, ansiosamente, esperavam junto à
Igreja do Senhor dos Navegantes.
'Isto foi um
milagre muito grande. Quando soube da notícia desmaiei e só consegui
sossegar quando ouvi a voz do meu filho ao telefone', disse ao CM
Assunção Marques, mãe do pescador Bruno Marques.
Já
Maria das Dores Fangueiro, mãe de outro pescador, Claudino Manuel,
falou de 'um susto de morte', referindo que quando lhe chegou a notícia
do naufrágio, pelas 06h30, 'a primeira coisa que me veio à cabeça foi
que tinham morrido todos'.
'Felizmente Deus esteve do lado deles. Obrigado Senhor dos Navegantes', disse Maria das Dores, abraçando emocionada o filho.
O
dono do barco, Manuel Fortunato, realçou que 'o importante é que
ninguém tenha morrido'. 'Quero agradecer à Força Aérea, à Associação
dos Pescadores, à Câmara de Vila do Conde e à tripulação do barco
‘Pereira e Moça’ [barco que prestou auxílio] porque a eles se deve a
vida destes homens', disse.
Claudino Manuel,
Bruno Marques, Francisco Xavier, António Tato, Carlos Manuel (mestre do
barco), António Cascão, Vítor Vieira, Tiago Novo e Salvador Craveiro
tiveram a sorte que poucos têm nestes casos. O barco foi ao fundo e
conseguiram escapar ilesos. O presidente da Câmara de Vila do Conde,
Mário de Almeida, falou de 'uma grande sorte, quase um milagre'.
PORMENORES
AGRADECIMENTO
Na
missa das 18h30 de ontem, o pároco das Caxinas, padre Domingos
Oliveira, que em 34 anos já sepultou 77 pescadores, agradeceu a Deus a
boa sorte dos nove homens.
HABITUADOS À TRAGÉDIA
O
povo das Caxinas já não estranha as más notícias e as mortes dos homens
que vão para o mar. Desta vez, rejubilaram: os pescadores salvaram-se
todos.
DUAS HORAS À PROCURA
O helicóptero da Força Aérea sobrevoou a zona do naufrágio durante mais de duas horas até detectar os pescadores.
NAVIO JAPONÊS SOCORRE SETE
Os
dois primeiros homens foram resgatados pelas 05h45, depois do
helicóptero da Força Aérea os ter procurado durante duas horas. Dado
que o combustível estava a esgotar-se, tiveram de regressar ao Montijo,
mas deram as coordenadas a um navio japonês que se encontrava na área e
que recolheu do mar os restantes sete homens. Quando o segundo
helicóptero chegou os sobreviventes foram resgatados pelo mesmo sistema
que os anteriores: um recuperador-salvador desceu até eles e
recolheu-os um por um por intermédio de um cabo de aço e de um colete.
Chegaram ao Montijo, pelas 13h45.
'OPERAÇÃO COMPLEXA' DEVIDO AO MAU TEMPO
'Foi
uma operação complexa', contou ao CM o piloto do primeiro helicóptero,
capitão Marco Casquilho, que chegou ao local do naufrágio cerca das
05h45. 'Estava muito vento, na ordem dos 60 km/h, e a ondulação também
era forte, com ondas de quatro metros e meio, e era ainda de noite, o
que dificultou bastante o resgate', explicou. Foram estas condições as
responsáveis pelo afastamento das duas balsas salva-vidas do local
original do naufrágio.
O piloto lembra ainda que
os dois homens que resgatou 'estavam muito abalados, mas bem de saúde,
pois as balsas estavam bem equipadas'. O tenente-coronel António Moldão
foi o segundo piloto a partir para o local do incidente, onde resgatou
os restantes sete homens, já a bordo de um cargueiro japonês,
mobilizado para o socorro.
Ontem, na Base Aérea
nº 6, no Montijo, os nove pescadores foram recebidos pelo armador e por
José Festas, presidente da Associação Pró-Maior Segurança dos Homens do
Mar, que garantiu que foi 'a calma que tiveram e o facto de o navio
estar muito bem equipado com dispositivos de segurança' que levou a que
tivesse sobrevivido a mais de oito horas no mar.
Na
base, os nove homens tomaram banho, vestiram roupas da Força Aérea,
almoçaram, tiraram uma foto de grupo com os pilotos, e seguiram de
imediato viagem para Vila do Conde num autocarro.
UM MILHÃO DE EUROS AO FUNDO
O
‘Luís Fortunato’, com vinte metros de comprimento, saiu a primeira vez
para o mar em meados de 1996 e naufragou a meio do chamado tempo útil
de vida, que, neste tipo de embarcações, é de 25 anos.
Novo, custa 'para cima de um milhão de euros', diz o mestre José Festas, da Associação dos Pescadores das Caxinas.
No rol de prejuízos, há ainda a juntar as cerca de sete toneladas de pescado, na maioria espadarte, que seguiam nos porões.
A 'motora', como chamam os pescador a este tipo de embarcação, possuía todo o equipamento necessário para a pesca em alto-mar.