Belisquem-me, isto não está a acontecer!
Não ganhou mais nada, mas este é dele, de goleada. O prémio «Calado é um
poeta» vai para Carlos Queiroz. O treinador que começou o ano como
seleccionador e com «uns empurrões» a um comentador e assessor da FIFA
no aeroporto foi apurando a queda para tiradas esquisitas. Lembra-se da
vaca e do leite que ia secar? A coisa atingiu o ponto mais... baixo no
estágio da Covilhã. Na altura só ouviram os médicos, depois partilharam
connosco aquele «vão controlar a c... da mãe do Luís Horta». Não podia
piorar, pois não? Mas não ficou por aqui. Ainda houve a cabeça do polvo
que era Amândio de Carvalho, ou o «não sou atrasado mental, demente,
alcoólico ou deficiente». E em jeito de remate, mesmo a fechar o ano, o
comentário à
F.C. Porto-Benfica, 5-0,
A conquista do título fez do Benfica o grande triunfador nacional em
2010, com a equipa de Jorge Jesus a inverter a relação de forças com o
F.C. Porto, pela primeira vez em cinco anos. Faltava ver se os festejos
de Maio eram o início de um novo ciclo, ou se os hábitos recentes seriam
retomados no Dragão.
Os primeiros jogos da nova época começaram a dar força à segunda
hipótese, com as equipas a evoluírem em sentidos opostos. A 7 de
Novembro a resposta tornou-se evidente. O incontornável Hulk, em estado
de graça, foi o maior protagonista de uma goleada nunca antes vista. Os
5-0 deram asas à equipa de Villas-Boas e abriram brechas importantes na
união encarnada. Jorge Jesus passava a estar na mira dos seus adeptos,
por várias adaptações mal sucedidas. O élan criado pela vitória na Liga
ficava para trás, obrigando o Benfica a olhar em frente, bem mais cedo
do que estaria à espera.
É a imagem da desolação, daquele que foi um dos melhores de Portugal no
Mundial. Eduardo, em lágrimas, esconde a cara com as luvas no relvado do
Green Point, depois do adeus. Fim da linha para a Selecção frente à
Espanha, depois do único golo sofrido em toda a competição. Ele defendeu
muito, evitou males maiores, foi o último a cair. Não foi por Eduardo,
nem foi pela defesa, que Portugal não foi mais longe. Uns mereciam menos
que outros.
Apagão internacional
Em ano de apagão de várias estrelas (que é feito de Usain Bolt, Tiger
Woods e Michael Phelps?), a Fórmula 1 foi, como sempre, uma constelação
de tricas e vencedores antecipados, mas desta feita com um final
surpreendente. Num ano que começou marcado pelo regresso do histórico
Michael Schumacher, depois de três anos de ausência, a F1 coroou o seu
compatriota Sebastian Vettel, o mais jovem campeão do mundo de sempre.
Enquanto em Espanha os foguetes já andavam no ar, em Abu Dhabi um erro
estratégico da Ferrari tirou o título a Fernando Alonso na última
corrida. Um momento que marcou as modalidades em 2010, veja mais dez.
O ano da Espanha
Ano de Campeonato do Mundo exige a vénia sacramental: nada do que
aconteceu nestes doze meses foi tão relevante como a vitória da Espanha
na África do Sul. Oitava selecção a ostentar a coroa suprema, a «roja»
fechou um percurso iniciado com a conquista do Euro-2008. Só a Alemanha,
em 1972/74, e a França em 1998/2000, tinham conseguido acumular os
títulos mais importantes de selecções. Mais relevante do que esse dado
foi a consagração de uma abordagem ao jogo, com a posse de bola como
fundamento, em tudo diferente da receita de sucesso aplicada pela Itália
quatro anos antes. Nem tudo foi perfeito, é verdade: a Espanha foi a
primeira campeã derrotada no jogo de estreia, e a que marcou menos
golos, num percurso minimalista, que só impressionou na recta final.
Mas, tudo somado, fica a memória de uma equipa que, aproveitando uma
máquina de futebol chamada Barcelona, levou as boas ideias até ao fim
Mourinho, o ano dele
José Mourinho em 2010 começa com as algemas que simbolizam o divórcio
crescente com Itália e acaba na ressaca da maior derrota que alguma vez
sofreu. Pelo meio, tudo. A caminhada da Liga dos Campeões, com aquela
meia-final para a história frente ao Barcelona. A «tripletta»: Taça de
Itália, «Scudetto» e, pois, a Taça dos Campeões Europeus. Ganhou-a pela
segunda vez, por clubes diferentes, só mais dois treinadores o
conseguiram. Como da primeira vez, foi-se embora. Depois de se despedir
do F.C. Porto em Gelsenkirchen, adeus ao Inter ainda no Bernabéu. Dias
depois, o regresso a Madrid para assinar pelo Real. Agora Mou, «El
Especial», monopolizou atenções, ganhou fãs e embirrações. Como sempre. O
duelo com Guardiola, no segundo confronto do ano, resultou em KO. 5-0.
Uff. Depois deste 2010 em que se dá a si próprio nota 11, ele enfrenta
um desafio à sua medida para o ano que vem. E agora, Mou?
Grande também nas dívidas
Bem esbraceja Platini com o «fair-play» financeiro, e com a promessa de
que em três anos ninguém poderá competir nas competições da UEFA sem
contas equilibradas. Algo vai seriamente mal no futebol quando até o
maior clube do Mundo, em pleno ciclo de conquistas, assume perante os
adeptos um endividamento recorde de 400 milhões de euros e um prejuízo
de 80 milhões no final de uma das melhores temporadas de sempre. A
lavagem de roupa suja entre Sandro Rosell, novo presidente do Barcelona,
e o seu antecessor, Joan Laporta, atingiu níveis invulgares, em
especial num emblema que sempre fez gala em ser «Més que un club». O
anúncio, no final do ano, do primeiro patrocínio pago às camisolas
«blaugrana» (30 milhões por ano) virou outra página nessa pretensão à
diferença. Todos diferentes, todos iguais: só o tamanho das dívidas
varia.
Iniesta comove o Mundo
Quando, aos 116 minutos da final com a Holanda, Iniesta marcou o golo de
uma vida, 750 milhões viram-no tirar a camisola e exibir para as
câmaras uma t-shirt com a inscrição «Dani Jarque sempre connosco». O
tributo ao antigo companheiro nas selecções jovens, vitimado onze meses
antes por um ataque cardíaco, foi uma nota tocante nas celebrações
espanholas, reforçando a dimensão humana dos novos campeões.
Barcelona-Inter, 1-0 (28 de Abril)
Poucas vezes houve tantas leituras à volta de um jogo. E talvez nunca,
como nessa noite, se tenha discutido tudo, desde o princípio. O que é
jogar futebol? O que é jogar bem? O que é uma grande equipa, um grande
treinador? Por palavras e acções, Barcelona e Inter, Guardiola e
Mourinho, deram respostas antagónicas às questões.
Por detrás, uma bela vitória do Inter, em São Siro, valia dois golos de
vantagem. Cabia ao Barça anulá-los. E ao Inter anular o poder ofensivo
do Barça, assente numa posse de bola insaciável. Mourinho abordou o
problema retirando a bola da equação e entregando-a, por inteiro, ao
adversário.
A expulsão de Thiago Motta acentuou a opção: o Inter ficou em campo
somente para defender um território, e fê-lo com uma perfeição épica. O
Barça ganhou 1-0, mas ficou pelo caminho. «A derrota mais bela da minha
vida», disse Mourinho, embalado para o título europeu. Em Novembro,
Guardiola e o Barça responderam-lhe de forma arrasadora. O debate
continua em 2011.
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